mort mot juste

outubro 09, 2007

dia do julgamento final- um 'exercício de relax' sem pretensões literárias.

o dia do Ajuste de Contas chegou, e mandaram lá dos estratos mais altos da República- ou do céu- um cavaleiro para tratar das execuções.
o seu trabalho era matar todos mesmo, sem perdões. porque todos haviam sido mentirosos, beberrões, impiedosos, adúlteros, traidores, arrogantes, ambiciosos, amantes dos prazeres, amantes do dinheiro, fumantes, injustos, fornicadores, preguiçosos, espertalhões, curiosos, indecentes, gulosos, iracundos, vaidosos, mesquinhos, castos, generosos, comedidos, diligentes, pacientes, caridosos, humildes, engraçados, austeros, altos, baixos, feios, boa-pinta.
como eu dizia não se salvava um. momento propício para o narrador oniciente resolver começar uma história: pude assistir a tudo de camarote.
o cavaleiro ia de garganta em garganta, primeiro com uma certa cerimônia, depois quase descuidado, mal olhando para as vítimas, estava começando a se enfadar e ainda não havia chego a um bilhão.
alguns tinham tempo de implorar, choravam com os olhos no céu ou no chão, a mãe pelos filhinhos, o rapaz por sua mocidade... esses levavam a espada atravessada entre as costelas, que o cavaleiro andava impaciente.
quando já restavam apenas os seres sem pecado e sem razão e eu, o tipo veio querer me cortar a garganta. não que eu fosse especial, que eu fosse imune, que eu fosse muito esperta. mas encarei o sujeito nos olhos, pela primeira vez no dia do Ajuste de Contas ele encarava por mais de dois segundos alguém que estava prestes a matar. acho que ele se confundiu com isso, ou lembrou de ter esquecido o forno ligado. seja o que for, adiou a minha morte até o momento presente. eu diria uns 32 dias de encarar o cavaleiro do Apocalipse, sentir seu hálito sobrenatural, enganar a morte. não tive mais acesso a calendários ou relógios, mas 32 dias soa razoável.
acho que o truque é ficar imóvel e insistente, pois ele tem me levantado a espada ameaçadoramente mas fora isso ainda conservo meu pulso. para falar a verdade depois de tanto tédio já começo a desejar a morte, mas isso passa, então eu não desgrudo os olhos do sujeito. ele realmente deve ter se sentido confuso. ou vai ver que parou pra pensar no que andou fazendo com as pessoas só agora.

o que importa é que estou enganando a morte por mais tempo. e que continuo enganando, e continuo vivendo. só pelo desafio já valeu a pena, penso seriamente em baixar os olhos e ir ter com meus amigos do outro lado, que deve estar em festa.

maria 4:41 PM 0 vociferando estavam



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