mort mot juste

janeiro 22, 2008

Minha Mãe e o Sonho

"Meus pés congelam", tua voz me provoca dores agudas na fronte, boa mãe. Estás para mim como a última árvore após o incêndio, e o mundo tosse seus últimos momentos, me explica o sorriso minha velha, como é possível? Empurro seu ombro um pouco, esperava que me dissesse se está louca, ou morta; o que há de tão majestoso no horizonte fora a montanha com a última árvore? Se é deus que ela vê, nada me relata, e começo a fechar os pulsos e os olhos numa agonia de morte.

De olhos cerrados posso constatar que ela respira, mínguas de fogo ainda crepitam ao longe, o vento desloca a fumaça. Acabou, abandonada ao nada mais que se fazer ao lado de minha mãe enlouquecida, os corpos de meus amigos mais queridos tão silentes e despedaçados à nossa volta como um tapete de rendição. A guerra de armas intactas e disparos divinos ainda estoura em meus órgãos vitais. Chuva, grito em mente, a última de todas. A tempestade aumenta rapidamente e imagino toda a terra inundada e inválida como se fosse um recomeço, uma segunda chance de um criador supremo infinito e toda a ficção reconfortante. As nuvens se chocam e detonam clarões sobre o solo devastado, um dos raios ilumina o rosto de minha mãe.
A última vez que a vi, e estava tranqüila, e havia na sua boca uma expressão de prazer. Ela realmente havia perdido a sanidade. Os trovões aumentavam em número e volume, eu tinha certeza de que ficaríamos surdas para o resto do tempo que nos restasse.

Junto de meu corpo eletrocutado, minha mãe inclinou as feições num sorriso terno do olhar, como se me oferecesse um último beijo na testa. Caminhou vagarosamente para longe de mim como se soubesse exatamente para onde deveria ir, e mais uma vez lançou ao meu cadáver o olhar materno e doce, boa noite minha filha, boa noite.


(postando novamente uns textos perdedores de concurso)

maria 1:00 PM 0 vociferando estavam



ao rés da fala